INTRODUÇÃO
O apóstolo João, um judeu monoteísta profundamente instruído nas tradições religiosas judaicas, não introduziu um novo Deus ao escrever seu Evangelho. Em vez disso, ele integrou o conceito do “Verbo” (Logos) à compreensão já estabelecida da divindade de Javé, o Deus de Israel. João não admitia a existência de qualquer outra divindade além do Deus único revelado nas Escrituras judaicas (Mc 12.28-30). No prólogo do seu Evangelho, ele descreve o Verbo com atributos divinos, enfatizando sua natureza eterna e sua participação na criação do universo. Essa abordagem não apenas reforça a continuidade entre o Antigo e o Novo Testamento, mas também estabelece a base para a doutrina cristã da divindade de Jesus Cristo.
I- A DOUTRINA BÍBLICA DA DIVINDADE DE JESUS
- Jesus é Deus
O Novo Testamento é inequívoco ao afirmar a natureza divina de Jesus. Passagens como João 1.1 (“E o Verbo era Deus”) e João 20.28, onde Tomé se dirige a Jesus como “Senhor meu e Deus meu!”, são claras em sua declaração. Além disso, textos como Filipenses 2.6, Colossenses 2.2, Tito 2.13, 2 Pedro 1.1 e 1 João 5.20 reforçam que Jesus não é apenas um ser celestial elevado, mas o próprio Deus encarnado. Essas afirmações são fundamentais para a teologia cristã, pois estabelecem Jesus como o ponto central da revelação divina e da salvação. - Atributos divinos de Jesus
Os atributos divinos são características intrínsecas à natureza de Deus, e Jesus compartilha desses atributos de maneira plena. A onipotência (todo-poder) é evidenciada em passagens como Mateus 28.18, onde Jesus declara: “Toda autoridade me foi dada no céu e na terra”. A eternidade de Jesus é afirmada em Isaías 9.6, onde ele é chamado de “Pai da Eternidade”, e em Miqueias 5.2, que fala de suas origens eternas. A onisciência (conhecimento total) é demonstrada em João 2.24-25, onde Jesus conhece os corações humanos, e em João 16.30, onde os discípulos reconhecem que ele sabe todas as coisas. Por fim, a onipresença (estar em todos os lugares ao mesmo tempo) é evidenciada em Mateus 18.20 e 28.20, onde Jesus promete estar com seus seguidores em todos os momentos. Esses atributos confirmam que Jesus não é apenas um ser humano exaltado, mas o próprio Deus em forma humana.

II – A HERESIA QUE NEGA A DIVINDADE DE JESUS
- O Arianismo
O Arianismo, uma das heresias mais impactantes da história da Igreja, surgiu no século IV com Ário, um presbítero de Alexandria. Ário defendia que Jesus, embora fosse um ser celestial, não era eterno nem igual a Deus Pai. Ele argumentava que o Verbo (Logos) era uma criatura, a primeira e mais elevada das criaturas de Deus, mas não divino em essência. O lema ariano, “houve um tempo em que o Verbo não existia”, resumia sua negação da eternidade de Cristo. Essa visão foi condenada no Primeiro Concílio de Niceia (325 d.C.), que afirmou a divindade plena de Jesus e a sua consubstancialidade (homoousios) com o Pai. - Argumentos arianos e sua refutação
Os arianos usavam passagens bíblicas isoladas para sustentar suas crenças. Por exemplo, Provérbios 8.22, na Septuaginta (tradução grega do Antigo Testamento), foi interpretado por eles como indicando que o Verbo foi “criado”. No entanto, o verbo hebraico qānâ pode significar “possuir” ou “adquirir”, e não necessariamente “criar do nada”. Além disso, Colossenses 1.15, que descreve Jesus como “o primogênito de toda a criação”, foi mal interpretado pelos arianos. O termo “primogênito” (prototokos) não indica que Jesus foi criado, mas sim que ele tem primazia sobre toda a criação, sendo o agente da criação e a imagem visível do Deus invisível (Cl 1.16-17). A unidade entre o Pai e o Filho é claramente afirmada em João 10.30: “Eu e o Pai somos um”. - Solução para a controvérsia
A controvérsia ariana foi resolvida através de uma interpretação cuidadosa das Escrituras, levando em consideração o contexto e a unidade da revelação bíblica. O Concílio de Niceia reafirmou a doutrina da Trindade, declarando que Jesus é “verdadeiro Deus de verdadeiro Deus, gerado, não criado, consubstancial ao Pai”. Essa definição tornou-se um marco na teologia cristã, estabelecendo a base para a compreensão ortodoxa da natureza de Cristo.
III – IMPLICAÇÕES DO ARIANISMO NA ATUALIDADE
- A Tradução do Novo Mundo
O Arianismo moderno pode ser visto em grupos como as Testemunhas de Jeová, que utilizam a Tradução do Novo Mundo das Escrituras Sagradas. Essa versão altera passagens-chave para negar a divindade de Jesus. Por exemplo, João 1.1 é traduzido como “e a Palavra era um deus”, com “deus” em minúsculo, sugerindo que Jesus é um ser divino inferior. No entanto, o texto grego original não permite essa interpretação, afirmando claramente que “o Verbo era Deus”. Outras passagens, como Tito 2.13 e 2 Pedro 1.1, que identificam Jesus como “Deus e Salvador”, são distorcidas pela inserção de palavras que não existem no original, como “do”, para separar Jesus da divindade. - Movimentos orientais e outras religiões
Muitos movimentos religiosos orientais, como o Hare Krishna, negam a divindade de Jesus, vendo-o como um mero guia espiritual ou uma encarnação entre muitas. No Islã, Jesus é considerado um profeta, mas não o Filho de Deus ou Salvador. As religiões reencarnacionistas, como o Espiritismo, também rejeitam a divindade de Jesus, tratando-o como um médium ou filósofo. Essas visões contrastam radicalmente com o ensino bíblico, que apresenta Jesus como o único Salvador e o Deus encarnado (At 4.12; Hb 7.26). - A singularidade de Jesus
A Bíblia afirma que Jesus é único em sua natureza e missão. Ele não é apenas um entre muitos mestres espirituais, mas o próprio Deus que se fez homem para redimir a humanidade (Rm 9.5; Fp 2.6-8). Sua ressurreição é a prova definitiva de sua divindade e da eficácia de sua obra salvadora (1 Co 15.14-17).
CONCLUSÃO
A doutrina da divindade de Jesus é central para a fé cristã. Negar essa verdade é negar a própria essência do Evangelho, pois somente Deus pode salvar (Is 45.21). Se Jesus não é Deus, então sua morte e ressurreição não teriam poder para redimir a humanidade. Portanto, a afirmação de que Jesus é Deus não é apenas uma questão teológica, mas uma verdade vital que sustenta a esperança da salvação. Como afirmou o apóstolo Paulo: “Se Cristo não ressuscitou, é vã a vossa fé” (1 Co 15.17). A divindade de Jesus é, portanto, a pedra angular da fé cristã e a base da esperança eterna.