A Missão da Verdade que Salva
Quando Jesus afirmou que a verdade liberta (Jo 8.32), Ele não estava apenas apresentando um benefício pessoal e espiritual ao indivíduo. Estava, também, convocando todos os libertos pela verdade a se tornarem testemunhas dela. O Evangelho não nos alcança para que fiquemos sentados em bancos ou paralisados em experiências emocionais — ele nos alista para a missão. Uma vez libertos pela Verdade que é Cristo, somos chamados a proclamá-la. A verdade que salvou nossa alma precisa ser anunciada ao mundo. Porque onde há trevas, o brilho da verdade deve resplandecer. Onde há mentira, a verdade precisa ser defendida. Onde há morte, a verdade precisa ser pregada como vida.
O chamado da Igreja à missão nasce exatamente da natureza da verdade que carrega. A verdade do Evangelho é objetiva, universal e eterna. Não é uma opinião entre outras, nem um caminho alternativo entre vários. Jesus foi enfático: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai senão por mim” (Jo 14.6). Essa exclusividade, longe de ser arrogância religiosa, é expressão da realidade divina. Não há outro nome dado entre os homens pelo qual devamos ser salvos (At 4.12). Essa verdade não é apenas teórica — ela é uma Pessoa viva. E, como tal, deve ser conhecida, amada e proclamada.
A missão da Igreja, portanto, é a missão da verdade. Não de uma verdade genérica, filosófica ou emocional, mas da verdade revelada em Cristo e registrada nas Escrituras. A própria Grande Comissão (Mt 28.18-20) é o envio da verdade ao mundo. “Ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho mandado” — eis o centro da missão. A evangelização sem doutrina é apenas entusiasmo; o evangelismo sem verdade é marketing; a missão sem fidelidade bíblica é ativismo religioso. A Igreja foi chamada para anunciar a verdade de Deus com graça, clareza e poder — sem maquiagem e sem medo.

John Stott, com sua precisão cirúrgica, escreveu: “A missão da Igreja é proclamar a verdade da cruz em um mundo hostil que prefere a mentira do ego.” Não por acaso, a Escritura repete, desde o Antigo Testamento, que o mundo jaz no engano.
O profeta Isaías já advertia: “A verdade anda tropeçando pelas ruas” (Is 59.14). Jeremias denuncia: “Cada um engana ao seu próximo, e não falam a verdade” (Jr 9.5). No Novo Testamento, Paulo descreve os tempos finais como marcados por homens que rejeitam a verdade e preferem fábulas (2 Tm 4.4). E Pedro fala de falsos mestres que introduziriam heresias de perdição (2 Pe 2.1). O contexto da missão, portanto, é um campo minado de mentiras – e exatamente por isso a missão da verdade é tão urgente.
Por isso, a Igreja deve tomar consciência do seu papel como coluna e baluarte da verdade (1 Tm 3.15). Isso significa que a verdade não será sustentada pelas academias, pelos parlamentos, nem pelos meios de comunicação. Não será sustentada pelos algoritmos, nem pelos influenciadores digitais. Cabe à Igreja — e somente à Igreja — manter firme a luz da verdade, mesmo quando todas as outras vozes se calarem ou se corromperem. Como disse Martinho Lutero: “Se eu pregar com a maior eloquência todas as verdades da Bíblia, exceto precisamente aquele ponto que o mundo e o diabo estão atacando no momento, então eu não estou pregando o Evangelho.” Ser fiel à verdade exige coragem para confrontar as mentiras do tempo presente.
A missão da verdade, no entanto, não é meramente defensiva. Ela é proclamadora. A Igreja não foi chamada a apenas resistir às trevas — foi chamada a iluminá-las. O apóstolo Paulo, em 2 Coríntios 4.6, diz que Deus “resplandeceu em nossos corações para iluminação do conhecimento da glória de Deus, na face de Jesus Cristo.” Essa iluminação que recebemos deve agora ser espalhada. Como em João 8, a luz da verdade precisa invadir os pátios, os lares, os becos, os púlpitos, as escolas e os campos. A missão cristã não é algo reservado a poucos vocacionados — ela é o chamado de todo aquele que foi alcançado pela verdade libertadora de Cristo.
Isso nos leva a um ponto essencial: somente quem foi realmente liberto pela verdade pode anunciá-la com autoridade. Há muitos que falam de Jesus, mas nunca foram transformados por Ele. Há mensagens sobre o Evangelho que não têm poder porque são anunciadas por lábios que não foram purificados, por vidas que não foram redimidas. A missão nasce da experiência: quem encontrou a verdade não pode mais se calar. Como disse Charles Spurgeon: “Se você afirma que foi salvo, mas não deseja que outros sejam salvos, então duvido que você tenha sido salvo de verdade.”

A aplicação disso é prática: a Igreja precisa restaurar uma cultura de testemunho pessoal da verdade. Pastores precisam pregar como quem vive o que anuncia. Professores da Escola Dominical devem ensinar como quem já foi quebrantado pela Palavra. Jovens devem falar de Jesus com a mesma convicção com que defendem suas músicas preferidas. Crianças devem aprender desde cedo que viver na verdade é mais precioso do que ser aceito pelo mundo. E, acima de tudo, o Espírito Santo deve ser honrado como o Espírito da verdade, que guia, inspira, convence e transforma (Jo 16.13). Não há missão eficaz sem dependência total do Espírito.
Mais do que isso, a Igreja precisa ter uma liturgia da verdade. Cultos centrados na Palavra, músicas que cantam a verdade bíblica (e não apenas sentimentos), orações encharcadas da Escritura, ceias que relembram a verdade da cruz, batismos que proclamam a verdade da regeneração. A missão da Igreja começa no culto — mas não termina nele. O mundo está faminto por algo real. As pessoas estão sendo destruídas por mentiras doces que matam. A verdade pode doer, mas salva. E quem ama de verdade, fala a verdade.
Finalmente, a missão da verdade é escatológica. Um dia, todo joelho se dobrará, e toda língua confessará que Jesus Cristo é o Senhor (Fp 2.10-11). Isso significa que a verdade vencerá, mesmo que agora seja rejeitada. Mesmo que zombem dela. Mesmo que seja silenciada. A verdade de Deus é como um rio subterrâneo: ela continua fluindo, mesmo quando parece ausente. E, no tempo certo, ela romperá a superfície e julgará todas as mentiras dos homens. Por isso, a Igreja precisa perseverar. Não nos cabe convencer o mundo — nos cabe proclamar fielmente o que é verdadeiro. A colheita não é nossa — mas o semear é.
Portanto, somos chamados a viver a verdade, amar a verdade e anunciar a verdade. Porque a verdade é Cristo. E Cristo é o centro da missão. Que cada membro da Igreja seja um porta-voz da verdade. Que cada congregação seja um farol. Que cada púlpito seja um altar onde a verdade que liberta, redime e santifica seja proclamada sem filtros. Que, quando o mundo nos olhar, veja em nós a mesma coragem que viu em Estevão, a mesma ousadia que ouviu em Paulo, e a mesma fidelidade que brilhou no nosso Senhor. Porque a missão não é nossa — é do Reino da Verdade. E a Verdade já venceu.